"Red or Blue" é a exposição que revela o artista Daan van Golden ao público português. Miguel Matos faz-lhe a visita guiada.
Daan van Golden (Roterdão, 1936) é um artista venerado na Holanda desde a década de 1960, mas só chegou agora à Culturgest, no âmbito da sua missão de divulgação de nomes menos conhecidos.
No início da carreira, van Golden adopta um estilo de expressionismo abstracto, mas com um trabalho ainda imaturo. É isso que ele próprio percebe numa viagem ao Japão em 1963. Esta estadia foi uma experiência de desenraizamento em relação ao seu contexto social e artístico, um distanciamento que ditaria as regras da sua arte até hoje.
“Quando ele lá chega, toma consciência de que o seu trabalho estava esgotado”, explica Miguel Wandschneider, responsável pela vinda da exposição a Lisboa. “No Japão, ele é influenciado pela meditação e pela filosofia Zen, começando a desenvolver um trabalho em que concebe a actividade artística como uma espécie de meditação. Um dia, encontra no chão do seu ateliê uma amostra de tecido e copia-a para uma tela. Reproduz padrões abstractos encontrados em papel de embrulho em lenços ou toalhas de mesa.” A ligação com a filosofia Zem dá-se neste trabalho de quase mimetismo, com uma dimensão meditativa, devido à sua lenta elaboração. “Há uma grande meticulosidade e rigor que envolve um esvaziamento mental”, diz Wandschneider.
Não se colando a nenhum movimento artístico, Daan van Golden pisca o olho à Arte Pop europeia e à Op Art, passando pelo minimalismo e pela arte conceptual. Mondrian, Pollock, Matisse, Giacometti e Yves Klein são também referências que ele usa sem pudor. Como se mistura tudo isto? Primeiro que tudo, as quadrículas que ele encontra nas toalhas de mesa acabam por ser derivações das linhas geométricas que Mondrian tinha explorado.
Depois, Golden encontra figuras em imagens alheias que supostamente não possuem um lado figurativo. Em fotografias de flores ele encontra rostos e num pequeno fragmento de uma composição abstracta de Jackson Pollock ele descobre gente, pássaros ou raposas e copia estes detalhes para telas, aumentando a sua escala. Redescobre motivos, isola-os e apropria-se disso. A certa altura ele descobre figuras de pássaros nos veios e nós de uma tábua de madeira. Acaba por emoldurar essa tábua e considera-a como objecto artístico, na tradição do object trouvé.
Mais à frente nesta exposição, um marco na sua vida: em “Golden Years”, o artista colecciona recortes de fotografias em jornais com a respectiva legenda. Selecciona uma imagem de cada ano da sua vida, por entre as imagens guardadas numa caixa. O resultado é uma série cronológica que acaba por ser uma história subjectiva da fotografia. “Esta obra é um atlas da sua vida e da própria fotografia”, diz Miguel Wandschneider. Fotógrafos emblemáticos são mais uma vez apropriados numa viagem por imagens de guerra, ícones de beleza e do espectáculo, pela música rock e pelas divas do jazz. Personagens como Brigitte Bardot, Andy Warhol, Elvis Presley, Bob Dylan, os Rolling Stones, Bill Gates e Keith Haring contam a história do século XX.
O lado pessoal de Daan van Golden não é directamente explorado nesta exposição, mas acabamos por conhecê-lo intuitivamente. Tal como em “Golden Years”, uma outra linha de tempo é criada com a obra “Youth is an Art” que não é mais do que uma série de fotografias espontâneas do quotidiano da filha e das viagens que fez com o pai, desde o nascimento à idade adulta. “Red or Blue” traz à evidência que no trabalho de Daan van Golden há sempre uma disponibilidade para acolher os acasos do quotidiano na arte.
“Red or Blue”está patente na Culturgest até 6 de Setembro. Aberta de segunda a sexta das 11.00 às 19.00. Sábados, domingos e feriados das 14.00 às 20.00. Encerra terças. 2€.
Time Out, 4 de Agosto de 2009
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