segunda-feira, 16 de maio de 2011

Manuel Caeiro - 12 000 m2 dentro de um T0


Haverá espaço para habitar dentro ou para lá de uma parede? Há. 12 000 metros quadrados! A pintura de Manuel Caeiro (Évora, 1975) tem o dom de cruzar e fundir de forma original o concreto com o abstracto num resultado que convoca a presença física do espectador e a coloca em confronto com a tridimensionalidade que a tela sugere. A sua obra parte frequentemente de elementos visuais que reconhecemos do quotidiano urbano, como a sinalética de perigo ou aviso, os materiais de construção e estruturas que lembram andaimes ou construções de base arquitectónica. Elementos que o observador reconhece com rapidez mas que, durante o tempo de observação de cada quadro, e à medida que a retina dança e avança pela tela, se tornam progressivamente destituídos da sua função de representação. A imagem complexifica-se e transforma-se progressivamente num espaço de linhas, cores e manchas que activam o espaço à sua volta. Multiplicações das formas, rebatimentos, repetições, modulações e reverberações da cor compõem quadros de apelo cinético e raiz construtivista.

O mecanismo que anima habitualmente a obra de Manuel Caeiro está bem presente nesta exposição de trabalhos recentes em que a abstracção é assumida, num acentuar da geometria e do espaço arquitectónico. Há nestas pinturas, expostas na Galeria Carlos Carvalho, em Lisboa, um jogo de dinâmicas e paletas que explodem em linhas de tensão e ritmos que fazem com que o olho sinta dificuldade em se concentrar num único ponto. A aplicação destemida da cor, o desvendar da estrutura de composição, a sujidade da tinta e os enganos cometidos: tudo é assumido e integrado. São telas cerebrais na sua concepção, mas espontâneas no resultado que denota uma velocidade frenética. No entanto, o que poderia ser apenas um truque é afinal uma sinceridade artística que resulta em imagens deslumbrantes e que não perdem interesse após um primeiro relance. Em “12 000 m2 dentro de um T0” verifica-se uma depuração do caminho já percorrido e confirmável em exposições anteriores. Neste fluxo visual ainda se encontram os elementos de sinalética que constituem o leitmotiv do pintor, mas nota-se um gradual desprendimento dessa fórmula. Apesar disso, Manuel Caeiro ainda os retoma em alguns trabalhos mais discretos, de menor dimensão, em acrílico e fita sobre c-print.

Diz Jorge Emanuel Espinho na folha de sala da exposição: “Visitar esta mostra de pintura é uma experiência bipolar. Primeiro estática, de simples contemplação dos espaços profundos e largos de que estas obras tratam, visual apenas; e depois dinâmica na sua acção psicológica, pensada, de inserção e relação nesses próprios espaços.” É este o segredo de Manuel Caeiro que vem provar que a estafada teoria da morte da pintura não poderá ser confirmada tão cedo. Porque uma criação desvitalizada não pode puxar o corpo para dentro de uma tela, activando profundidades visuais que fazem esquecer que por detrás está apenas cimento ou pladur. É essa activação espacial que a pintura de Manuel Caeiro tão bem consegue.

Miguel Matos

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