Há uma macaca à solta no Museu da Cidade e bichos humanos com relações disfuncionais. Mas não vai ser necessário entrar de catana em riste e não vai encontrar o David Attenborough a falar sobre as estranhas criaturas sociais de Sara Maia na exposição “Doméstica Vida Selvagem”...
Estas pinturas e desenhos falam de relações humanas distorcidas, até grotestas. Qual é a história subjacente a elas?
Acho que o título diz logo alguma coisa sobre o que quis explorar acerca da diferença entre o lado mais artificial ou racional e o lado mais sensitivo ou animal que temos em nós. É uma realidade que tenho explorado constantemente no meu trabalho.
Esse tipo de ideias vem no seguimento da exposição “I Love You Dysfunctional”, que fizeste há dois anos na Ermida de Nª Srª da Conceição...
Sim, as relações são sempre funcionais e disfuncionais ao mesmo tempo. Acho que só alguém que seja bastante hipócrita é que pode negar isso. Mas aqui foco mais o facto de as pessoas passarem a vida a negar o seu lado animal, vivendo num plano quase artificial... Vivemos em prédios, com alguma segurança, mas se vivêssemos ao ar livre podiamos ser como macacos, digo eu.
E falando em macacos... De que trata esta história?
Há mesmo uma macaca nesta exposição que vai vestir um vestido de princesa. Muitas vezes tentamos vestir ou despir papéis. Onde é que fica a nossa essência no meio disto tudo? A ideia começou com um conto português de tradição oral. É um homem que se apaixona por uma macaca e gosta dela como ela é. Um dia apresenta-a à família e é muito embaraçoso porque toda a gente começa a rir por ela ser uma macaca. Ela sente-se mal com isso e quer ser aceite, o que é uma coisa bastante comum a todos nós. Propõe-se então levar uma chicotada para se transformar em humana.
Isto tem a ver com o teu interesse por coisas obscuras?
Mas isso não é nada dark, até é bom uma pessoa gostar de alguém por aquilo que ela é...
Esse conto transpõe-se para telas e desenhos...
São quase 12 telas, algumas delas que transitaram da exposição “I Love You Dysfuncional” e desenhos. Alguns deles não são novos mas nunca viram a luz do dia. Foram feitos quando eu tinha 16 anos, se calhar não seria suposto eu mostrá-los aqui e agora, mas como é um tema que acompanha tudo aquilo que faço, achei interessante mostrar a génese de tudo.
Insistes em trabalhar a pintura em exclusivo, o que parece ser uma coisa fora de moda, obsoleta. E, pior ainda, trabalhas a narrativa dentro de um registo figurativo. São muitos pecados para uma artista jovem. Como te atreves?
Não me quero armar em D. Quixote, em defensora da pintura. Acho que uma tela em branco é uma possibilidade tão grande como outra coisa qualquer. Nunca me faltou coisas para dizer. É um meio como outro qualquer, se resultar enquanto comunicação não acho que seja minimamente obsoleta. Para mim a arte é comunicação, essencialmente. Não é o meio em si que legitima a obra, mas sim o que funciona entre quem vê e quem faz.
Mas não te sentes um pouco solitária nessa opção?
Sim, sinto. Quando me perguntam o que é que eu faço e eu respondo que sou pintora, as pessoas acham que tenho uma grande lata de fazer pintura quando tudo já está feito. Mas eu oiço isso tantas vezes que parece que fazer pintura é um insulto nos dias de hoje. É quase como se a pintura fosse uma coisa sagrada. Como se, por ter uma história tão longa, já não se pudesse acrescentar mais nada.
Consideras-te uma outsider?
Sou uma outsider julgada como uma clássica. Mas, ao mesmo tempo isso é muito mais outsider do que se estivesse a fazer coisas de acordo com as tendências, como a instalação. É engraçado pensar naquilo que é clássico, afinal.
Nestas últimas telas estás a modificar a tua técnica e a tua linguagem... Há mais cores planas, menos atenção aos fundos, uma figuração muito recortada e estratégias da pintura naïf, como a desproporcionalidade entre elementos. Isso afasta-te das relações e semelhanças que alguns apontam entre ti e Paula Rego, por exemplo.
Quando eu exponho em França dizem que faço lembrar Matisse. Em Espanha comparam-me com outros artistas, mas eu acho que isso tem a ver com a história da pintura e com a necessidade que as pessoas têm de enquadrar as coisas e colocá-las em caixas. Isso para mim é honroso, mas ao mesmo tempo é pesado. É hipócrita negar que se tem referências, mas não quero que pensem que faço copy/paste porque é um trabalho muito pessoal. E não é só à pintura que vou buscar referências, mas também ao cinema, à dança e à vida, sobretudo. Às vezes acho que me chamam “a segunda Paula Rego” de uma maneira muito mázinha. Não sou a segunda nem a primeira nem coisa nenhuma.
Estas pinturas e desenhos falam de relações humanas distorcidas, até grotestas. Qual é a história subjacente a elas?
Acho que o título diz logo alguma coisa sobre o que quis explorar acerca da diferença entre o lado mais artificial ou racional e o lado mais sensitivo ou animal que temos em nós. É uma realidade que tenho explorado constantemente no meu trabalho.
Esse tipo de ideias vem no seguimento da exposição “I Love You Dysfunctional”, que fizeste há dois anos na Ermida de Nª Srª da Conceição...
Sim, as relações são sempre funcionais e disfuncionais ao mesmo tempo. Acho que só alguém que seja bastante hipócrita é que pode negar isso. Mas aqui foco mais o facto de as pessoas passarem a vida a negar o seu lado animal, vivendo num plano quase artificial... Vivemos em prédios, com alguma segurança, mas se vivêssemos ao ar livre podiamos ser como macacos, digo eu.
E falando em macacos... De que trata esta história?
Há mesmo uma macaca nesta exposição que vai vestir um vestido de princesa. Muitas vezes tentamos vestir ou despir papéis. Onde é que fica a nossa essência no meio disto tudo? A ideia começou com um conto português de tradição oral. É um homem que se apaixona por uma macaca e gosta dela como ela é. Um dia apresenta-a à família e é muito embaraçoso porque toda a gente começa a rir por ela ser uma macaca. Ela sente-se mal com isso e quer ser aceite, o que é uma coisa bastante comum a todos nós. Propõe-se então levar uma chicotada para se transformar em humana.
Isto tem a ver com o teu interesse por coisas obscuras?
Mas isso não é nada dark, até é bom uma pessoa gostar de alguém por aquilo que ela é...
Esse conto transpõe-se para telas e desenhos...
São quase 12 telas, algumas delas que transitaram da exposição “I Love You Dysfuncional” e desenhos. Alguns deles não são novos mas nunca viram a luz do dia. Foram feitos quando eu tinha 16 anos, se calhar não seria suposto eu mostrá-los aqui e agora, mas como é um tema que acompanha tudo aquilo que faço, achei interessante mostrar a génese de tudo.
Insistes em trabalhar a pintura em exclusivo, o que parece ser uma coisa fora de moda, obsoleta. E, pior ainda, trabalhas a narrativa dentro de um registo figurativo. São muitos pecados para uma artista jovem. Como te atreves?
Não me quero armar em D. Quixote, em defensora da pintura. Acho que uma tela em branco é uma possibilidade tão grande como outra coisa qualquer. Nunca me faltou coisas para dizer. É um meio como outro qualquer, se resultar enquanto comunicação não acho que seja minimamente obsoleta. Para mim a arte é comunicação, essencialmente. Não é o meio em si que legitima a obra, mas sim o que funciona entre quem vê e quem faz.
Mas não te sentes um pouco solitária nessa opção?
Sim, sinto. Quando me perguntam o que é que eu faço e eu respondo que sou pintora, as pessoas acham que tenho uma grande lata de fazer pintura quando tudo já está feito. Mas eu oiço isso tantas vezes que parece que fazer pintura é um insulto nos dias de hoje. É quase como se a pintura fosse uma coisa sagrada. Como se, por ter uma história tão longa, já não se pudesse acrescentar mais nada.
Consideras-te uma outsider?
Sou uma outsider julgada como uma clássica. Mas, ao mesmo tempo isso é muito mais outsider do que se estivesse a fazer coisas de acordo com as tendências, como a instalação. É engraçado pensar naquilo que é clássico, afinal.
Nestas últimas telas estás a modificar a tua técnica e a tua linguagem... Há mais cores planas, menos atenção aos fundos, uma figuração muito recortada e estratégias da pintura naïf, como a desproporcionalidade entre elementos. Isso afasta-te das relações e semelhanças que alguns apontam entre ti e Paula Rego, por exemplo.
Quando eu exponho em França dizem que faço lembrar Matisse. Em Espanha comparam-me com outros artistas, mas eu acho que isso tem a ver com a história da pintura e com a necessidade que as pessoas têm de enquadrar as coisas e colocá-las em caixas. Isso para mim é honroso, mas ao mesmo tempo é pesado. É hipócrita negar que se tem referências, mas não quero que pensem que faço copy/paste porque é um trabalho muito pessoal. E não é só à pintura que vou buscar referências, mas também ao cinema, à dança e à vida, sobretudo. Às vezes acho que me chamam “a segunda Paula Rego” de uma maneira muito mázinha. Não sou a segunda nem a primeira nem coisa nenhuma.
Miguel Matos
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